Em nosso texto anterior - CHEGANDO AO INCONSCIENTE - e pelas afirmações de Jung ,vemos como sempre se fala do
inconsciente a partir do consciente, até mesmo como a sua negação, mas o que é
inconsciente?
No dicionário Caldas Aulete encontramos:
“ Inconsciente – que não tem consciência de si mesmo, dos
seus atos; a parte de nossa vida psíquica excluída da consciência por
recalcamento.”
Assim, inconsciente sempre aparece como adjetivo, como
aquilo que não é consciente.
Freud porém nos apresenta o ICS como substantivo, como um
sistema psíquico distinto dos demais e dotado de atividade própria.
Na 1ª tópica Freud sistematiza o ICS tentando ordenar os conteúdos representativos
das pulsões. Segundo Zeferino Rocha “ numa atitude apolínea”,.... tenta
controlar com a razão o mundo irracional do ICS.”
Na 2ª tópica Freud dá prioridade à dimensão pulsional do
ICS, passando a “ocupar o 1º plano o elemento dionisíaco”.
Freud apela para um além
da razão.
Assim podemos definir, baseados em Freud, o ICS como:
um sistema dinâmico regido pelo processo
primário, que se estrutura como um campo de forças.
Muitas vezes – antes e depois de Freud – o ICS foi
identificado com o caos, o ilógico, o mistério.
Segundo Scarlett Marton o termo ICS no pensamento de
Nietzsche designa o domínio que escapa à linguagem, o domínio do indizível, não
podendo remeter a nenhum princípio ordenador mas significando silêncio,
singularidade, indizibilidade.
O ICS então, não seria derivado da consciência, não seria
formado de conteúdos recalcados de representações conscientes.
Deleuze distingue dois usos do termo ICS na obra de
Nietzsche: um para caracterizar a atividade, de forma geral, e outro para
designar um dos sistemas do aparelho reativo. As forças reativas sempre limitam
a ação, dividem. As forças ativas são um estado de expansão, intensificação;
elas afirmam a potência, criam valores.
Para Naffah Neto “ o ICS ativo é que constitui de fato o ICS
no sentido forte do termo. O ICS reativo só é ICS no sentido tópico do
conceito, quer dizer, na medida em que ele corresponde a um passado que precisa
se manter afastado da consciência para que esta acompanhe os movimentos do
real, e o presente possa ser o tempo dominante. Em outros termos, ele só é ICS
porque o homem está constituído por uma temporalidade e precisa, devido às
necessidades adaptativas, manter um reservatório de memória disponível à
consciência mas distinto dela.
.......”já disse Suely Rolnik: Ele (o ICS) designa um
universo indizível e invisível, marginal à consciência e com o qual é preciso
entrar em
ressonância. Invisível
e indizível, porque é fluxo, devir, sem forma ou representação definida, campo
de forças móveis e vibráteis. Espaço virtual, gerador de novos códigos, onde
reencontramos a pulsação da vida na sua forma afirmativa: o sim inicial a tudo
o que é humano”.............
Com base no princípio
nietzschiano, o ICS seria um conjunto de forças móveis,
indizíveis/invisíveis, que não tolera formas fechadas, acabadas, excludentes;
não conhece ordem; suas leis são o acso, o devir, a multiplicidade. Não conhece
morada fixa, sendo o eterno construir e destruir de si próprio.
O ICS de Freud – do recalcado, não se opõe ao ICS da vontade de potência, do
esquecimento de Nietzsche. Em arte terapia trabalhamos somando conceitos, teorias,
experiências.
É necessário estabelecer a diferença entre recalque e
esquecimento.
O recalque é um dos destinos do representante ideativo das
pulsões, tendo por finalidade evitar o desprazer. O outro representante
psíquico da pulsão – o afeto – não pode, ele mesmo, ser recalcado. O que se
torna ICS é a idéia à qual o afeto estava ligado, podendo também ser deslocado
para outra idéia.
Em outras palavras o recalque afasta as representações da
consciência, separando-as das palavras, evitando o desprazer. Entretanto estas
representações continuam atuando de forma subterrânea, reaparecendo através do retorno do recalcado.
O esquecimento é um mecanismo não consciente, que descreve
um processo de elaboração ativa de digestão das experiências, ou seja, a
plasticidade das forças ativas regenera, remodela, torna possível a digestão
das experiências.
Viver – isso significa para nós: transmudar
constantemente tudo o que somos em luz e chama; e também tudo que nos atinge;
não poderíamos absolutamente fazer de outro modo.
........um mar de forças tempestuando e ondulando em si
próprias, eternamente mudando, eternamente recorrentes, com descomunais anos de
retorno, como uma vazante e enchente de suas configurações, partindo das mais
simples às mais múltiplas, do mais quieto, mais rígido, mais frio, ao mais
ardente, mais selvagem, mais contraditório consigo mesmo, e depois outra vez
voltando da plenitude ao simples, do jogo de contradições de volta ao prazer da
consonância (..), como um vir a ser que não conhece nenhuma sociedade, nenhum
fastio, nenhum cansaço – esse meu mundo dionisíaco do
eternamente-criar-a-si-próprio, do eternamente-destruir-a-si-próprio (..)
quereis um nome para esse mundo? (..) Esse mundo é a vontade de potência – e
nada além disso! E também vós sois essa vontade de potência – e nada além
disso.
Nietzsche
Fontes:
Freud: Aproximações, Zeferino Rocha
O Inconsciente como potência subversiva, Alfredo Naffah Neto
MARCOLINO
ResponderExcluir