Mestres

segunda-feira, 30 de maio de 2011

As muitas máscaras que usamos

 

Enéas Martim Canhadas

Todos nós?

Sim. As máscaras que usamos são as maneiras como a nossa personalidade se apresenta ao meio onde convive e para o mundo no qual existe e se relaciona. Os Espíritos, uma vez encarnados, passam a usar máscaras para apresentarem-se como são. Assim somos um Espírito dotados da personalidade com que desejamos ser reconhecidos. As máscaras que usamos são intermediárias entre a nossa essência - Anima - (Alma na conceituação de Jung[1]) e a nossa exterioridade, Persona[2] pela qual nos apresentamos.

É possível exemplificar?

A pessoa altruísta, a auto suficiente, a pessoa carinhosa, a que está sempre desconfiada, a egoísta, a briguenta, a honesta, a pessoa carente ou parasita, a que se faz pai ou mãe de todos, a mentirosa, narcisista, a otimista ou pessimista, a pessoa colaboradora ou individualista, a pusilânime fraca de ânimo e sem firmeza, a religiosa, a sofredora, a solitária, a sonhadora, são alguns exemplos de máscaras que usamos. Não se trata, portanto, de negativo ou positivo, de bom ou mau. São maneiras de ser que compõem a personalidade de alguém e fazem parte da alma, isto é, da essência da pessoa.

Afinal de contas, somos obrigados a usar máscaras ou devemos tirá-las?

Não se trata de desvencilhar-nos das máscaras, como tiramos uma roupa que não vamos mais usar. A questão é que, precisamos das máscaras todos os dias. É assim que garantimos o desempenho dos vários papéis nas nossas vidas ao nos relacionarmos.  São atitudes adequadas para as várias circunstâncias que se apresentam na vida. O que importa é a consciência de que elas representam faces da personalidade que vêm da nossa Alma, como partes do todo que somos. Não se trata de eliminar as máscaras mas de aprender a conviver com elas, até que um dia não tenhamos mais necessidade disso. Dessa convivência, decorrem o nosso desenvolvimento intelectual, psíquico-emocional, moral e espiritual traduzindo a nossa atuação de ser-no-mundo, o que nos dá uma identidade. Este caráter mediador das máscaras, constituem-se em bastões em que nos apoiamos para dar conta do nosso modo de ser. São alavancas quando podemos mostrar um pouco mais da nossa essência interior em atitudes e são margens dando-nos a noção dos nossos limites e competências. Este “caminhar mascarado” nos conduzem na trajetória rumo à plenitude espiritual. 

Mas, não somos as nossas próprias máscaras?

Não somos. Aí é que está o “x” da questão.Pensar que somos a própria máscara faz-nos perder de nós mesmos. Se não houver nada além da máscara, seremos parciais, incompletos, pedaços de Espírito e não um Espírito uno. Se fôssemos pedaço de Espírito, seríamos como mônadas[3] aleijadas ou mutiladas, incapazes de, um dia, alcançar a plenitude. Somos um “holos[4]” em desenvolvimento. Somos completos e caminhamos para viver em plenitude. O que aprendemos não ocupa espaço e nem precisa produzir tentáculos. Assim desenvolvemo-nos como um todo. O problema não é de crescimento físico, mas sim de ampliação da consciência, e consciência não ocupa um espaço geograficamente delimitado. Quando alguém identifica-se ou deixa-se absorver pela persona, isto é, pela máscara, passando a conviver com os outros assim, estará fugindo ou afastando-se da própria essência. Isto significa, em termos práticos, que está esquecendo de si mesmo, perdendo o foco da busca pessoal, desvia-se dos seus projetos futuros. Neste caso, a pessoa ficará sujeita ou escravizada às opiniões alheias. Torna-se mais preocupada com o que os outros esperam ou pensam dela. Torna-se alguém que parece não ter vontade própria e passa a depender das opiniões e aprovações de amigos, parentes, pais e demais pessoas da sua convivência. Sente-se infeliz mediante qualquer comentário que não aprove suas ações, decisões, escolhas ou preferências Sentirá insegurança com medo de ter que enfrentar a realidade. Qual realidade? A de que necessita apropriar-se de seus desejos e preferências, idéias ou opiniões, escolhas ou pontos de vista, mesmo que não coincidam com o que os outros gostam. Escolher os próprios caminhos, é a maior tarefa de quem caminha.

Então temos que tirar as máscaras para mostrar a Alma?

Também não é assim. Identificar-se com a Anima (Alma para Jung),  significa ser uma pessoa voltada inteiramente para dentro de si mesma, tornando-se egoísta, individualista ou auto centrada, o que não permite uma relação com o mundo e com as pessoas, porque ela está em contato apenas consigo mesma. A música composta por Antonio Nóbrega[5] e Wilson Freire, diz assim: “Menina, vou te ensinar como é que se namora: põe a alma no sorriso e o sorriso põe pra fora”. Esta figura fala claramente da essência e da máscara que se usa para manifestar tal atitude. “A máscara social é, portanto, a veste necessária para a adaptação social. Com efeito, esta é entendida como indispensável por si, ou então como aquilo ao qual nenhum de nós pode renunciar. (O caráter necessário atribuído à mascara deve ser entendido como uma impossibilidade para a nudez. Aquilo que está em questão, portanto, não é o despojar-se da máscara em nome de possível nudez, e sim a possibilidade de representar uma ulterioridade ou um além em relação à máscara, isto é, através de tal noção, o indivíduo é convidado a sair do engano de trocar tal “parte” com o todo da sua individualidade e, portanto, do erro de considerar que sob, por trás ou além da máscara não exista outra coisa)”[6]. Pensar que podemos dispor das máscaras ainda não nos é possível. Ainda não podemos expor a nudez do nosso próprio Espírito. Devido a imaturidade, somos apegados a velhos hábitos[7]. Quando Adão e Eva viram-se nus no Paraíso, procuraram cobrir sua nudez, simbolizando que ainda não estavam preparados para ela. Não podemos nos suportar nus e despojados. Não somos capazes de suportar os nossos pensamentos, incongruências, anseios, desejos, maus quereres, preconceitos, motivos, etc. quando ficam à mostra para os outros pois, nos veríamos cheios de dúvidas, medos, inseguranças, vergonhas e incertezas de todo tipo.

Parece que a gente é o que é sem tirar e nem por . . .

Se isto significar consciência de si mesmo, é verdadeiro. Existe ainda um outro tipo de máscara que é a “máscara funerária, o arquétipo imutável, no qual supostamente a morte se reintegra” segundo M. Burckhardt[8]. As suposições deste pesquisador vão mais além quando diz “não se dar sem perigo quando se trata de um indivíduo que não atingiu certo grau de elevação espiritual.” No Egito antigo portanto, a máscara mortuária significava a paralisação, a impossibilidade de mudar, cessando o aprimoramento, ainda acarretando riscos para quem não tivesse elevação espiritual. Isto sabemos segundo a Doutrina Espírita quando Espíritos ficam presos por fascinação ou outros motivos à sua personalidade passada. O aprimoramento do Espírito prossegue a cada novo projeto encarnatório, e usando outras máscaras, representaremos novas condições adquiridas. Entretanto, afinidades com máscaras usadas em tempos passados permitem que os espíritos, tenham preferências por esta ou aquela aparência ao se apresentarem para os encarnados. Para Espíritos esclarecidos, trata-se apenas de mera preferência.

Como entender, ao mesmo tempo, que a evolução prossegue na dimensão espiritual?

A evolução no Plano Espiritual, não dispensa a prática que tem lugar no campo do exercício terreno, condição diferenciada de residência transitória na matéria, para consolidar mudanças e aprendizados. Somos muito vulneráveis às mudanças quando ainda não tenham adquirido consistência na vivência prática, no exercício das relações com os outros. As encarnações sucessivas bem justificada pelo comentário no Livro dos Espíritos à resposta da pergunta 619 reitera que “a justiça da multiplicidade de encarnações do homem decorre deste princípio, pois a cada nova existência, sua inteligência se torna mais desenvolvida e ele compreende melhor o que é o bem e o que é o mal”. As sucessivas encarnações não significam simples capricho da resolução criadora de Deus que se concretiza pela evolução. É condição normal e prática[9] uma vez que “a alma compreende a lei de Deus,  segundo o grau de perfeição a que tenha chegado e conserva a sua lembrança intuitiva após a união com o corpo (...). É, como poderíamos dizer, a práxis do Espírito.
[1] Carl Gustav Jung (1875-1961) psiquiatra suiço nascido a 26 de julho de 1875, em Kresswil, Basiléia, na Suíça, no seio de uma família voltada para a religião. Seu pai e vários outros parentes eram pastores luteranos, o que explica, em parte, desde a mais tenra idade, o interesse do jovem Carl por filosofia e questões espirituais e o papel da religião no processo de maturação psíquica das pessoas, povos e civilizações.
Jung morreu a 6 de junho de 1961, aos 86 anos, em sua casa, à beira do lago de Zurique, em Küsnacht após uma longa vida produtiva.
[2] Termo latino que indica a máscara que o ator teatral, tanto cômico como trágico, punha no próprio rosto no decorrer da representação. Usado para designar indiferentemente um aspecto da personalidade, da psique coletiva ou mundana que se encontra dentro da própria personalidade; uma estrutura da psique e, portanto, uma das subpersonalidades que giram ao redor do Eu, cuja relação com o próprio Eu muda continuamente no curso da vida; a imagem que o indivíduo mostra externamente, e enquanto tal um dos aspectos mais exteriores do próprio indivíduo; papel ou o “status social” do indivíduo nas relações com o mundo (cultural e social, e portanto, o aspecto que ele assume nas relações com a cultura e com a sociedade.
[3] Do Latim monade e do grego monás, ádos, que quer dizer único. Em Biologia é o organismo ou unidade orgânica diminuta e muito simples. Em Filosofia, segundo Leibniz, cada uma das substâncias simples e de número infinito, de natureza psíquica (dotada de apercepção e apetição), e que não têm qualquer relação umas com as outras, que se agregam harmoniosamente por predeterminação da divindade, constituindo as coisas de que a natureza se compõe. Dicionário Aurélio Século XXI.
[4] Do grego hólos,  e quer dizer inteiro, completo, indiviso, compacto, homogêneo, fundamenta a teoria segundo a qual o homem é um todo indivisível, e que não pode ser explicado pelos seus distintos componentes (físico, psicológico ou psíquico), considerados separadamente.
[5] Composição de Antonio Nobrega, como ele mesmo se intitula “folgazão rabequeiro, dançador e cantor-brincante reconhecido”, e Wilson Freire, “Lição de Namoro” faixa do CD “Madeira que Cupim não Rói”, gravadora Eldorado.
[6] Citado no Dicionário Junguiano dirigido por Paolo Francesco Pieri (Florença 1943), membro ordinário da International Association of Analytical Psychology, analistya com funções didáticas junto ao Centro Italiano di Psicologia Analítica, Paulus, em co-edição com Edit. Vozes, São Paulo, 2002.
[7] Ler o capítulo “Velhos Hábitos” do livro “Renovando Atitudes” de Francisco do Espírito Santo Neto pelo Espírito Hammed, Edit. Boa Nova, Catanduva-SP., 1988. 
[8]Citado no Dicionário de Símbolos, verbete Máscara, autores: Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, José Olympio Edit., Rio de Janeiro, 1988.    
[9] Resposta à pergunta 620 do Livro dos Espíritos.

Fonte:  http://www.espirito.org.br/portal/artigos/eneas-canhadas/as-muitas-mascaras-que-usamos.html

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Transtorno de Pânico



Já trouxemos aqui uma síntese sobre o estresse.
Hoje damos continuidade, abordando mais especificamente o transtorno de pânico.
Qual a diferença entre ansiedade e estresse?  
“Cientificamente a Ansiedade é a mesma coisa que Estresse. A Ansiedade seria uma atitude normal e global do organismo, portanto fisiológica, responsável pela sua adaptação a alguma situação nova e atual. O Estresse é a atitude biológica necessária para a adaptação do organismo a uma nova situação. Em medicina entende-se o Estresse como uma ocorrência fisiológica global, tanto do ponto de vista físico quanto do ponto de vista emocional.”¹  Do ponto de vista psíquico o Estresse se traduz na Ansiedade. A natureza foi generosa oferecendo-nos a atitude da Ansiedade ou Estresse, no sentido de favorecer sempre a adaptação. Porém, não havendo período suficiente para a recuperação desse esforço psíquico, o qual restabeleceria a saúde, ou persistindo continuadamente os estímulos de ameaça que desencadeiam a reação de Estresse, nossos recursos para a adaptação acabam por esgotar-se. O Esgotamento é, como diz o próprio nome, um estado onde nossas reservas de recursos para a adaptação se acabam.
Organicamente,  no Esgotamento,  há alterações significativas nas glândulas supra-renais (produtoras de adrenalina e cortisona), há dificuldades no controle da pressão arterial, há alterações do ritmo cardíaco, alterações no sistema imunológico, no controle dos níveis de glicose do sangue, entre muitas outras. Psiquicamente a Ansiedade crônica ou Esgotamento leva à um estado de apatia, desinteresse, desânimo, medo e de pessimismo em relação à vida.
Psicanaliticamente falando, a  ansiedade é um estado afetivo que corresponde à antecipação de um desprazer, antes que ele aconteça, com base em outras experiências desprazerosas. Há dois tipos de ansiedade: a realística e a neurótica. A ansiedade realística acontece quando estamos diante de situações reais de perigo.  Aqui, a ansiedade é um sinal, que pode levar o indivíduo a buscar soluções para fugir ou se defender do perigo. A ansiedade neurótica parece sem sentido, pois não há um perigo real que ameace o sujeito.  Não há uma situação ou objeto específicos que o indivíduo tenha medo, ou o medo é exagerado, desproporcional. Para a Psicanálise, os ataques de pânico são o resultado de uma defesa mal sucedida contra impulsos geradores de ansiedade.  Embora muitos pacientes relatem que os ataques de pânico se iniciem “do nada”, quando se investiga melhor pode-se descobrir um claro ativador psicológico, não percebido pelo indivíduo.  Apesar de suas implicações biológicas, o início do pânico está geralmente relacionado com fatores ambientais ou psicológicos, a partir dos quais ocorrem as alterações neurofisiológicas. Os pacientes com transtorno de pânico geralmente tiveram acontecimentos vitais estressantes, como perdas significativas, nos meses antes do início da doença.  Além disso, estes pacientes parecem vivenciar maior sofrimento diante dos acontecimentos vitais, se  comparados com outros indivíduos. As causas dos ataques de pânico envolvem significados inconscientes de eventos estressantes, motivo pelo qual o tratamento busca um aprofundamento que não se restringe a simplesmente eliminar os sintomas, mas encontrar suas causas. Além do tratamento medicamentoso, acompanhado por um médico psiquiatra, o paciente com transtorno de pânico pode ser beneficiado com técnicas de modificação de comportamento utilizadas por psicólogos cognitivo-comportamentais, em busca da supressão dos sintomas e de uma melhor convivência social. A Psicoterapia, no entanto, buscará ajudá-lo a compreender o verdadeiro significado inconsciente de sua ansiedade e o simbolismo da situação vivenciada.

Eleonora Fonseca Vieira

¹ Dr. Geraldo Ballone
Especialista em psiquiatria pela ABP e professor do Departamento de Neuropsiquiatria da Faculdade de Medicina da PUCCAMP

Publicado originalmento em: http://www.blogdocaju.com/

segunda-feira, 23 de maio de 2011

A Importância da Atenção

Trazendo hoje este excelente texto sobre atenção, de um ponto de vista diferenciado.





 
Por Que o Fato de Estar Atento
Acelera o Crescimento Pessoal
 
 
Um Autor Anônimo
 
 
O verdadeiro estudo de qualquer área de conhecimento consiste em dedicar aos seus temas, repetidamente, uma tal quantidade de atenta consideração que, no final,  ela se torna parte integrante da consciência, e pode ser usada por uma ação mental automática em qualquer momento e em resposta a qualquer estímulo relacionado a ela.
 
O verdadeiro estudo de uma Arte consiste, primariamente, na repetição atenta da ação dos órgãos fisiológicos envolvidos na prática daquela Arte, até que aquela ação se torne automática,  e seja realizada tão bem e tão naturalmente quanto qualquer função fisiológica reflexa original.  
 
Nessas definições, a palavra que qualifica o progresso necessário é  o adjetivo atento, que assinala a presença da atenção durante a atividade. Sem esta palavra, as definições não só ficariam imperfeitas, mas seriam essencialmente incorretas e enganosas.
 
Só quando têm a qualidade de serem atentas é que a consideração e a ação repetidas podem produzir, por um lado, a posse de um novo campo de conhecimento,  e por outro lado, a posse  de uma nova área de poder.
 
Qual é a natureza e o modo de expressão  dessa suprema qualidade, a Atenção?
 
Uma visão intelectual adequada dessa questão, e a compreensão da influência desse tema nos processos da evolução humana pessoal, são elementos fundamentais para o conhecimento e a visão de um verdadeiro educador, seja ele um professor ou não.
  
A palavra Atenção é usada de modo amplo, mas vago, no ambiente educacional. No entanto não temos outra palavra para  descrever  coloquialmente aquela atitude de consciência que, em qualquer processo de estudo ou de aquisição de poder, é absoluta e continuamente exigida, para que possa haver resultados reais. O termo concentração é mais literalmente correto,  mas ‘concentração’ tem, na maior parte dos casos, uma aplicação demasiado limitada e específica. No uso comum,  é mais adequada a palavra “Atenção’.
 
No entanto,  a Atenção que estamos discutindo, a atenção de  todos os processos de aquisição de conhecimento, talvez possa ser melhor compreendida se for vista como Atenção Concentrada
 
A atenção  é aquela condição ou atitude em  que os raios da consciência estão firmemente e sem exceção centrados na coisa que está sendo feita ou no tema em  estudo.  Isso pode ser apresentado à consciência por um,  ou por mais de um,   dos sentidos;  ou pode já ser um conteúdo da mente. O elemento especial nessa  atitude é a concentração com que a consciência opera.  Essa concentração deve chegar a um ponto em que todos os outros objetos mentais ou sensíveis, exceto o único, tornam-se alheios ao seu campo de percepção.
 
No esforço para alcançar isso - para manter a atenção concentrada  -  a Vontade do indivíduo entra em ação, e a sua função no processo pode ser comparada ao papel que uma  lupa cumpre de queimar , se estiver situada entre os raios do sol e a superfície de um objeto.  Se o objetivo é que através da lente os  raios de sol produzam um efeito definido e observável, a lente deve estar em uma relação tal com o objeto que faça os raios de sol confluírem para um só ponto.  Esse ponto, ou foco,  recebe então toda a força dos raios que passam através da lente;  de toda a superfície ao seu redor, esse ponto é o centro da ação. Da mesma maneira a Vontade, ao concentrar a atenção, foca os raios da consciência e todas as suas forças dinâmicas inerentes sobre uma área limitada, que pode ser fisiológica, mental ou moral, conforme o caso, na  qual  está o trabalho a ser realizado.
 
Assim,  vemos que a Atenção é a concentração da Visão Mental,  mantida pela ação da Vontade. Não é uma função ou propriedade separada da mente, como a percepção, a imaginação, a  razão, etc., algo que  alguns  psicólogos poderiam levar-nos a supor. Ela é um modo de ação - o verdadeiro modo de agir da Vontade.  Em outras palavras, a atenção é a expressão definida e eficiente  da Volição ou Força de Vontade do indivíduo.
 
As funções de percepção, concepção, imaginação, etc., são instrumentos  do Eu Superior para que ele opere no mundo concreto e nas  representações mentais daquele mundo; quando uma (ou mais de uma)  destas funções opera com toda a sua força, sem dispersão em relação a qualquer objeto ao seu redor,  então existe Atenção.
 
A Vontade é a manifestação ou ação do verdadeiro Eu humano; a Atenção é o modo como aquela manifestação se mostra funcionalmente, e pela qual (e só por ela) se produzem resultados permanentes.
 
Em relação ao mundo psicológico em que a Atenção existe, podemos formular o esquema seguinte. O esquema pode ser útil para tornar mais claras as características gerais do assunto,  e indicar mais nitidamente o papel cumprido pela Atenção em todos os fenômenos psicológicos.
 
A fonte do movimento mental surge na Emoção -  o desejo de  saber.  
 
A direção do movimento é dada pela Razão - o que saber, e como.
 
O mecanismo do movimento é dado pelas Atividades Mentais (Percepção, etc.) - os meios pelos quais o conhecimento é adquirido.
 
A força que mantém o movimento está na Vontade (a energia do Eu superior), o modo pelo qual a continuidade da operação é assegurada.
 
A relação  eficiente entre os dois últimos grupos de fatores, e a  sua relação conjunta com o objeto de  estudo, dão o significado do termo Atenção.  A Vontade submete as atividades mentais à tarefa,   rígida e persistentemente.
 
O Eu Superior, através da Volição, só pode estabelecer relações com objetos externos a si através das atividades mentais - Percepção, Concepção,  Avaliação, Imaginação, etc. –  e para fazer isto, as atividades mentais devem ocorrer como uma linha direta entre o Eu Superior, representado pela Vontade, e o objeto a ser estudado,  assim como a arma de fogo do praticante de tiro ao alvo deve ser mantida com exata precisão,  longitudinalmente, entre o seu olho e o objeto que ele pretende atingir.  Se a  arma de fogo desviar-se por pouco que seja da linha exata de visão, o praticante errará o alvo; assim, também, se a Percepção,  a Concepção, a Avaliação ou a Imaginação, qualquer uma dessas atividades ou faculdades estiver em uso, e perder o seu alinhamento direto com o trabalho que está sendo realizado,  o resultado é o completo fracasso.  Nessa imagem ilustrativa, a firme manutenção da arma de  fogo em uma posição precisa é um símbolo da ação psicológica da Atenção.
 
Quando percebemos o alcance das verdades assinaladas acima, não podemos deixar de perceber a  função significativa que a atitude mental de Atenção tem, em todos os processos e esforços educacionais. Também é inegável o seu papel fundamental na criação de métodos verdadeiros e eficientes de ação cultural.  Ainda que estejam presentes a Volição, a Atividade Mental, a Luz da Razão, o Sistema Fisiológico de nervos e músculos,  e vastas quantidades de conhecimento,  que valor intrínseco e que resultado permanente podem ser alcançados com estes fatores, se não houver Atenção?
 
A educação moderna falha -  como é evidente para qualquer observador profundo da vida humana - em grande parte porque ela não dá a devida importância a este fator primordial da evolução pessoal. A inconstância, a falta  de objetivos e a mediocridade mental da vida adulta em geral, ao nosso redor, surgem desta omissão.
 
A educação moderna, com seus  inúmeros assuntos,  sua pressa de passar de um assunto para outro e sua ausência de uma meta clara, demonstra inconstância no uso do tempo e da consciência.
 
Inconstância é a antítese da Atenção Sistemática.
 
A educação moderna dirige uma área da qual nada de novo surge como fruto do seu cuidado e estímulo; ela não produz nada novo a partir do seu mundo caótico.
 
Isso resulta da inconstância dos seus métodos e da sua ação.
 
A vontade humana é um criador natural quando opera através da Atenção Concentrada. Mas a educação fracassa na sua verdadeira missão - de ser estímulo e fonte de orientação para a força criativa individual -  por causa do seu inexplicável desprezo por um princípio fundamental.
 
Sempre que se adquire uma habilidade, seja em que área for,  há uma nova criação; ela tem uma existência real e evidente e é objeto de posse e uso no mundo  da vida humana. Ela  não existia antes do seu desenvolvimento, provocado por uma Vontade pessoal que operou através das atividades mentais e influenciando um caos fisiológico.
 
Para evitar uma possível confusão ao examinar o assunto, deve-se assinalar aqui que já existe uma atitude mental à qual se aplica geralmente o termo Atenção.  Essa atitude pode ser chamada de Atenção Passiva. 
 
A Atenção Passiva governa a consciência quando alguém escuta um discurso eloquente ou uma palestra interessante.
 
Em  tais situações a Vontade está em suspenso, com a consciência provavelmente dominada por forças que  o Ocultista poderia chamar de mantrâmicas.
 
A Atenção Passiva também governa a  situação quando a mente segue uma sequência muito absorvente de pensamentos. Mas essa não é a forma  exigida para o crescimento pessoal.  Do ponto de vista educacional, ela é de pouco valor, e não tem necessariamente relação com o nosso objetivo. 
 
A Atenção cumpre um papel necessário em cada um dos níveis ou planos da vida humana:
  
1) No plano físico;  - na dimensão fisiológica dos sentidos específicos e dos sistemas nervoso e muscular.  A ação consciente sob o controle da atenção nesse plano resulta em habilidade, que é a base não só de toda arte e atuação artística, mas de cada movimento dos órgãos humanos e da sua estrutura, que seja adequadamente adaptado para o propósito prático de  expressar agilidade e harmonia.
 
2) No plano mental;  - no plano psicológico de conceitos, comparações, avaliações, deduções, especulações e ideais.  Nesse plano intelectual a energia  sob o controle da Atenção cria formas de pensamento lógico,  sistemático e consecutivo, campos de visão verdadeiramente panorâmicos, a partir de elementos intelectuais abstratos, e novas formas de emoção  que possuem poder e beleza.
 
3) No plano moral;  - na dimensão espiritual das verdades supremas, dos princípios vitais,  da busca pelo Infinito, das leis das relações humanas, e na aplicação de todos esses elementos a toda a conduta  da vida pessoal. Nessa área suprema dos sentimentos morais e das aspirações espirituais pela perfeição da vida,  a atenção se concentra sobre detalhes definidos do pensamento e do comportamento pessoais, sobre a produção de harmonia de espírito, sobre a confiabilidade da atitude, sobre a harmonia entre a conduta e os princípios, sobre o altruísmo em todas as suas formas eficazes, e o desenvolvimento de uma influência pessoal que tende sempre para a produção de uma  harmonia social vitalizadora.
 
Na evolução da vida pessoal, quando o objeto da ação  é uma área ou um detalhe de uma das dimensões mencionadas acima, a Atenção deve ser chamada de específica. Quando o controle do propósito da existência como um todo é mantido através da Atenção, estabelecendo-se uma unidade eficiente e bem ordenada entre as muitas divisões e detalhes daquele propósito, então podemos chamar a Atenção de  suprema.  
 
A idéia de “gênio” já foi definida como “uma capacidade infinita de ser meticuloso.”  A expressão “ser meticuloso” significa “dar forte atenção a pequenos detalhes”.  Uma “atenção intensa a detalhes” permite tomar  cada tijolo que será usado na construção da “mansão de todas  as formas agradáveis” - a estrutura do conhecimento pessoal, da capacidade e da habilidade pessoais  -  e colocá-lo cuidadosamente em sua  devida posição, cimentando-o de uma vez por todas.  Uma estrutura montada deste modo é substancial, espaçosa,  bonita e eficiente.
  
Esta estrutura, que resulta de infinitos cuidados continuados por muito tempo,  é o que o mundo admira e chama de Gênio.  Quase todos os seres humanos, se inicialmente guiados e apoiados ao longo  do trabalhoso caminho, e mais tarde estimulados a avançar por suas próprias Vontades, podem desenvolver alguma forma de poder e habilidade que os elevaria consideravelmente em direção àquela altura em que estão os Gênios, e desse modo o mundo comum passaria a ser muito menos vulgar, monótono e cego do que é atualmente.  Em resumo:
 
 A Atenção Concentrada é a expressão da Vontade, e a Vontade é a força animadora central, vinda do Eu Superior. A Vontade, operando com  Atenção sobre o caos do mundo que a rodeia, e coordenando as energias, as forças e as movimentações  daquele mundo, transforma-o em um território de ordem, força e propósito, que tem como centro o Eu Superior.
 
Assim ocorre uma Evolução Pessoal que resulta, a longo prazo, em uma Individualidade aperfeiçoada, um produto  da sua própria Vontade
 
 
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Nota dos Editores:
 
O artigo acima tem como título original “The Function of Attention in Personal Development” (“A Função da Atenção no Desenvolvimento Pessoal”) . Ele foi publicado pela primeira vez na edição de novembro de 1888 da revista teosófica “Lucifer”, de Londres (pp. 190-194).
 
A revista era editada por H.P. Blavatsky, e o nome “Lucifer” merece um comentário. A palavra significa, literalmente,  “portador da luz” e designa o planeta Vênus, a popular estrela do amanhecer e do entardecer.
 
Foi apenas o  cristianismo autoritário da idade média que preferiu inventar um significado assustador para a palavra, para assim melhor dominar os povos através da credulidade e do medo. A invenção de “Lúcifer” como um inimigo da Igreja católica foi uma desculpa teológica usada para justificar a tortura e o assassinato em nome de Deus de centenas de milhares de inocentes em todo o mundo, ao longo de vários séculos. Ao resgatar o termo usado para o planeta Vênus no mundo antigo, H.P. Blavatsky estava apenas desafiando a velha superstição ritualística da igreja romana.   
 
O artigo “The Function of Attention in Personal Development” foi reproduzido também na edição de março de 1953 da revista “Theosophy” (pp. 204-209) , de Los Angeles.
  
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Para ter acesso a um estudo diário da teosofia clássica, escreva para lutbr@terra.com.br e pergunte como é possível acompanhar o trabalho do e-grupo SerAtento.
 
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terça-feira, 3 de maio de 2011

Nietzsche para Estressados

Percy, Allan - Nietzsche para Estressados - tradução Rodrigo Peixoto; Rio de Janeiro: Sextante, 2011

Selecionamos alguns fragmentos do livro para compartilhar, apesar do autor, enquanto filósofo, defensor do aconselhamento filosófico, considerar que nós psicólogos e os psiquiatras, só tenhamos a oferecer "tratamentos longos, caros, incômodos e, muitas vezes, prescrevem remédios com efeitos colaterais."
Acreditamos que o livro oferece algumas reflexões pertinentes, a partir de citações atribuídas a Nietzsche. Sentimos o autor não ter citado de quais obras de Nietzsche  foram tirados os aforismos.


"E a primeira condição para encontrar-se é saber aonde se quer chegar." (pag. 7)
 "Ao sentir o cheiro de terra fresca, o ar limpo e o silêncio, que só é quebrado pelas pequenas criaturas ao redor, reencontramos nossa essência por tanto tempo abandonada". (pag. 9)
 "Não precisamos nos vestir bem, falar ou atuar de maneira especial. Basta nos deixarmos levar pelo mundo natural em direção ao nosso interior, onde um manancial de tranqüilidade nos espera." (pag. 9)
 "Qual é a próxima vida em que quero nascer?" (pag. 10)
 "O estresse não nasce das circunstâncias externas, mas da interpretação que fazemos delas." (pag.11)
"A palavra japonesa wabi-sabi define a arte da imperfeição: no que é incompleto, irregular e antigo existem vida e beleza, pois ai está contido o desejo que a natureza tem de aprimorar a si mesma."  (pag. 15)
“Podemos observar o mundo de duas maneiras: virando a cabeça para trás ou prestando atenção no que temos à nossa frente. E você? Que caminho prefere?” (pag. 18)
“Quem não sabe julgar o que merece crédito e o que merece ser esquecido presta atenção ao que não tem importância e se esquece do essencial.” (pag. 20)
“Como diz um dos poemas mais célebres do taoísmo, no silêncio e no vazio todas as coisas estão presentes em potencial. A mente é como um copo: antes de enchê-la, devemos esvaziá-la. Do vazio e do não ser surge a criatividade.” (pag. 28)
“Se estivermos conscientes de que todo fim é ao mesmo tempo um começo, a dor e o possível sofrimento serão para nós uma escola que nos permitirá entender mais profundamente o que significa ser humano.” (pag. 32)
“A dança talvez seja a expressão mais genuína da alegria humana.”  .... “A dança nos permite conhecer nossos sentimentos ao expressá-los como movimentos no espaço.” (pag. 43)
“Grandes vínculos se quebraram pela insistência de uma das partes em fiscalizar a outra. No momento em que deixamos de ser companheiros para assumir um papel paternalista, algo se rompe na amizade. A naturalidade dá lugar à dominação e se estabelece um jogo de poder que não beneficia em nada a relação.” (pag. 54)
“Talvez se trate unicamente de não pensar, de evitar perguntas que precisamos fazer a nós mesmos. As transformações nos assustam. E a solidão é, justamente, a pista de decolagem das grandes mudanças, o palco onde nos equipamos para renascer em uma nova viagem vital.” (pag. 56)
“Hans Christian Andersen disse que “os contos de fadas são escritos para que as crianças durmam, mas também para que os adultos despertem.”” (pag. 64)
“Quando não há preconceitos, a luz da faz florescer o melhor de nós em nosso jardim interior.” (pag. 70)
“Quando sentimos que oferecemos algo ao próximo, de repente tomamos consciência de nosso valor. Ninguém é mais pobre que uma pessoa que não dá nada, pois é na doação que demonstramos nossa riqueza.” (pag. 75)
“Como exercício para perceber e agradecer a magia da vida, crie sua lista de maravilhas e pendure-as em um lugar visível da casa, para que não se esqueça das dádivas recebidas.” (pag. 82)
“Assim como nossos sonhos nos definem, nossa identidade é a sensibilidade que nos distingue dos demais companheiros humanos, é nossas contribuição única para o mundo, nossa missão pessoal. Encontrar essa missão pode ser o trabalho de toda uma vida, mas apenas o fato de buscá-la já nos permite saber aonde vamos.” (pag. 84)
“Os sonhos são projetados por nosso arquiteto interior, mas para transformá-los em realidade, é preciso despertar o pedreiro que também vive em cada um de nó.” (pag. 93)
“Os filósofos terapeutas ajudam seus clientes a identificar o tipo de problema que enfrentam para poder encontrar a melhor solução, que normalmente é o pensamento filosófico mais adequado à personalidade e à formação intelectual do cliente.” (pag. 106)
“O conhecimento não ocupa espaço. Só nos falta vontade de pensar, comunicar e desligar a televisão por um tempo. Vamos colocar filosofia em nossa vida? (pag. 109)